sábado, 1 de outubro de 2005

Vergonha

Os três últimos dias foram pessoalmente complicados para mim. Talvez por isso, fui para o Restelo a tentar afastar os negros presságios que insistiam em assombrar-me.

Os piores receios foram superados. Começou numa surrealista capa do nosso (?) jornal, no melhor (pior) estilo pateta-piroso, modelo apoteótico do que se não deve fazer, modelo acabado disto em que o Belenenses, com a patética vaidade de alguns, se tornou: o Belenenseszinho rechonchudinho-cinzento-apalermado que está na cabecinha de alguns, desvirtuação vergonhosa do clube épico e cheio de Alma que foi.

Continuou na imagem deprimente de um estádio com pouco mais de 1.500 pessoas, mas que parece não doer o suficiente a quem decide para se decidir a fazer uma coisa tão simples como comunicar com os sócios e tentar acordar o gigante adormecido.

Continuou na táctica, se é que alguma havia, de um treinador que, não tirando os méritos do novo discurso deste ano - fazendo os apelos que os silenciosos dirigentes não fazem -, não consegue, ao fim de um ano e tal, ter um fio de jogo, e que pôs a equipa a defender não sei o quê.

Prosseguiu numa equipa apática e displicente, que ofereceu dois golos e pareceu quase sempre esquecida de tentar marcar algum. Nunca tendi a individualizar; nunca na minha vida - nem hoje - assobiei um jogador vestido com a nossa camisola; mas pergunto o que faziam ali o saltitão Vasco Faísca (pior de jogo para jogo, tendo já começado mal), o inane José Pedro ou o inofensivo (mas ainda idolatrado, num exercício de masoquismo) Paulo Sérgio.

Desembocou cá fora nos surpreendentes sorrisos em caras onde devia haver revolta e acção.

Culminou, enfim, na passagem pela estátua do Pepe, onde, noutros tempos, depois de um jogo como hoje, milhares de sócios exprimiriam acerrimamente o anseio de que algo mudasse mas que hoje, triste sinal dos tempos, se encontrava quase deserta.

Que é feito do Belenenses que eu conheci? Procuro sinais, e quase não vejo, quase não oiço... Quem sabe ainda o que foi o Belenenses?

Mas isto é só um desabafo, aproveitando a compreensível e louvável decisão do Pedro de não fazer crónica. Afinal, podemos sempre vender o Amaral ao Sporting, o Pelé ao Benfica e até o Marco Aurélio ao Porto. Para alguns, seria o delírio... Como o Belenenses "melhora" de década para década com os moderníssimos métodos de gestão, devo ser eu que estou errado. "É preciso é enterrar o passado." Pergunto-me, é se não está já todo enterrado.

"Acorda Belém, que o clube está em perigo"; "Meu Deus, somos tão poucos!" Acácio Rosa, 1990, 1991.