quinta-feira, 15 de dezembro de 2005

Inimigos Externos e Inimigos Internos

As entidades fortes reforçam-se com o conflito. Consolidam-se na resistência contra os assaltos dos inimigos externos. Definem a sua identidade no contraste com adversários e adversidades. E assim foi o Belenenses dos primeiros anos e durante décadas – o Belenenses que eu ainda conheci na minha meninice.

Com frequência, entretanto, as instituições mais fortes morrem por dentro, implodindo. Capitulam não por causa das ameaças e dos ataques vindo do exterior mas por perda da sua força interior. Os inimigos internos, tantas vezes inconscientes ou até bem intencionados, são os seus verdadeiros carrascos.

Quando alguém perde a sua identidade, a sua vontade de lutar com dignidade, e a sua auto-estima, perde tudo o que é essencial. E é sinceramente isto que eu temo, nestes tempos (que já são muitos anos) de Belenenses cinzento, inodoro e “emprestado”.

Não me entendam mal por que eu não estou a pôr em causa a dignidade de (quase; lá chegará o dia de ligar claramente este quase com o "flecha") nenhum dirigente actual nem sequer de nenhum belenense. Já fui acusado de distinguir belenenses de primeira e de segunda. Quem me imputou tal acusação, decerto que não sabe nem compreende que não há nada que eu deseje mais para o nosso clube do que ver todos os seus adeptos unidos sob um ideal, uma bandeira, uma força. Nenhum amor ao Belenenses é desprezável. Eu gosto muito do Belenenses. Tudo nele me encanta: a cor, o nome (tão diferente, para mais profundo, que Benfica ou Sporting, por exemplo), o seu grito “Belém!”, a sua longa resistência, o amor inflamado com que nasceu, se edificou e se fez grande. Não sei se o amo mais na ventura ou na adversidade; mas suponho que, como muitos outros, lhe quero ainda mais arreigada e “desesperadamente” quando as coisas correm mal. É por isso que aqui estamos, ainda, depois de tantas desventuras, depois de quase cairmos “do cimo do Monte Capitólio para a Rocha Trapeia”, depois de mordermos o pó da terra, depois de termos sido perseguidos, ultrajados, despojados... O que quero dizer, é que o Belenenses tem andado distante de si mesmo, alienado, esquecido, confundido, sem rumo e, sobretudo, sem raízes. Sem raízes fortes, qualquer planta acaba por definhar. E é sinceramente isto que eu temo, nestes tempos (que já são muitos anos) de Belenenses cinzento, inodoro e “emprestado”...


P.S. - Não gosto da palavra "inimigo". Usei-a somente para dar mais colorido ao texto - que, já agora, foi escrito em 10 de Dezembro.