terça-feira, 14 de março de 2006

BELENENSES - 2, Sp. Braga - 0 (A CRÓNICA DO JOGO)

“ISTO PARECIA O BELÉM DE HÁ 20 OU 30 ANOS ATRÁS!!!”

Vivendo um contexto extraordinariamente difícil, numa das mais deprimentes épocas da sua história, o nosso Belém fez esta noite aquilo em que muitos já não acreditavam (eu expressamente incluído) - um jogo digno de si próprio.

Por isso, como hoje ouvi dizer, e bem, na bancada, este Belenenses parecia aquele, o verdadeiro, o de há décadas atrás.

Hoje, a bancada esteve excelente. Voltarei a esse tema no final.

Comecemos pelo futebol propriamente dito.

Atendendo áquilo que ambas as equipas representam no contexto actual do futebol Português, eu diria que, esta noite, o Belém foi o Braga e o Braga foi o (sucedâneo informe) do Belém que tem andado por aí a jogar.

Ou seja, o Belém de hoje à noite foi a equipa compacta, solidária, aguerrida e confiante, foi a equipa em que cada jogador quis intimamente ganhar, aquela que esteve em campo com verdadeira crença naquilo que fazia.

Por sua vez, o Braga foi a equipa íntima e aprioristicamente derrotada, foi a equipa que nunca se conseguiu libertar de si própria enquanto fardo do seu próprio jogo, foi a equipa desligada, perdida em frustrações individuais, descrente no sucesso do que fazia.

Pondo as coisas de uma forma mais simples: o nosso Belém foi a equipa que acreditou; o Braga foi a equipa que não acreditou.

A somar a tudo isto, desde que entrou até que saiu de campo, o Belenenses foi a equipa que esteve apoiada por uma massa bastante significativa de adeptos, bastante motivada, confiante e psicologicamente entrosada com a equipa. O Braga, não.

E, assim, ganhámos com todo o mérito, sendo inequívoca a nossa superioridade. Isso mesmo diz a estatística das oportunidades falhadas. A nosso favor, Santa Maria de Belém só teve que aparecer duas vezes: uma vez à frente de Cesinha, na primeira parte, obrigando-o, isolado e de baliza aberta, a rematar frouxo para as mãos de Marco Aurélio, e ao minuto 36/37 da Segunda, altura em que a bola rondou a linha de golo de nossa baliza, não tendo entrado por intervenção divina desta.

Ao contrário, nós, além dos dois golos, perdemos variadíssimas oportunidades de golo. Pelas minhas contas, foram pelo menos 3 em cada parte, com saliência para um meio golo oferecido por Rui Jorge a Meyong na Primeira, que este falhou de cabeça, e para um raide se Silas com a bola a ficar a cêntímetros de ser empurrada para a baliza do Braga. Mas, houve mais, muito mais.

Durante praticamente todo o jogo, soubemos construir um significativo número de jogadas de ataque, nas quais desequilibrámos o adversário e levámos intencionalmente o perigo à sua baliza.

Defensivamente, estivemos muitíssimo bem.

A nossa vitória de hoje começa a ser ganha, creio, logo nos primeiros minutos quando desfrutamos de um número inusitado de ataques perigosos pelo nosso flanco esquerdo.

Essa nossa (surpreendente) audácia e capacidade ofensiva deu-nos o alento para construir uma vitória.

Diria, também, que ganhámos (e de que maneira) a batalha táctica, cuja vitória, em grande parte, na minha opinião, radica em dois factores: (i) a nossa defesa, em especial os centrais, superiorizou-se de tal forma aos atacantes do Braga que conseguiu, não só a sua neutralização, como, ainda, a possibilidade de retomarmos a posse de bola em posição de contra-ataque com muitos dos nossos homens, enquanto eles estavam desequilibrados e (ii) tivemos, também, um espaço que não temos contra as outras equipas. Neste particular, o Braga sofreu às mãos do seu novo estatuto de Neogrande, coisa que os obriga a subir e, consequentemente, a abrir.

Por outro lado, quando em posse de bola, desfrutámos de um erro crasso do Braga que foi a sua ausência de pressão alta, a qual, aliada à dádiva de espaço, nos permitiu com calma e paciência, construir jogadas de ataque que habitualmente não construímos.

Ou seja, nós, com apenas três homens declaradamente ofensivos, construímos muito mais futebol ofensivo real do que o Braga com os seus quatro iniciais que passaram a cinco/seis na segunda parte.

Isto foi fruto de uma melhor distribuição táctica, de uma melhor racionalização da troca de bola, de uma melhor temporização nas passagens e, insisto nisto, da segurança transmitida pela fabulosa exibição dos nossos dois centrais.

Ganhámos, também, os duelos individuais quase todos. Fizemos, inclusive, sair Wender substituído, sem honra nem glória, o que é raro.

Enfim, também contribuiu o facto de os nossos jogadores terem tido uma garra e uma entrega que habitualmente não têm.

Por falar em jogadores, hoje as notas são, claro está, merecidamente altas:

Marco Aurélio (3) – Curiosamente até teve uma noite tranquila. Mas, no que fez, transmitiu confiança à equipa;

Amaral (3) Bateu-se muito bem contra alguns dos mais rápidos extremos do nosso campeonato. Ganhou, por regra, os seus despiques individuais. Mas pode e deve dar muito mais;

Rolando (5) Pelé (5) – Os melhores em campo. Absolutamente fabulosos. Quando estão fortes e concentrados, como hoje, fazem uma das melhores duplas do nosso futebol. Meteram o (muito respeitável) ataque do Braga no bolso;

Rui Jorge (4) Ao seu nível, ia conferindo qualidade de troca de bola no início do nosso ataque e inteligentemente fazendo a primeira barreira (que a sua condição física permite) antes de largar o que não podia para a muralha Pelé/Rolando. Espero que saia o melhor possível daquela lesão. Faz-nos falta.

Sandro (4) Ao seu nível (que nunca é do outro mundo). Sobe ao 4 pelo golo nos abriu a porta dos 3 pontos.

Pinheiro (3,5) Como se sabe, não sou fã. Mas, hoje, reconheço que se galvanizou com o jogo e que foi até ao seu limite. Está bem, pronto, dou (4)

Amorim (4) Trabalhou incansavelmente. Falta-lhe ainda alguma, mas parece estar em ganho de fibra. Hoje, esteve interessado e dedicado ao jogo. É uma aposta que o clube deve prosseguir.

Zé Pedro (5) Zé Pedro fez, quanto a mim, o melhor jogo desde que está no Restelo. O primeiro golo é dele. Fez o remate de 40 metros que deu canto e marcou-o para a cabeça de Sandro. Teve as falhas que se lhe conhecem (alguns defeitos “de escola” como o facto de jogar de pernas esticadas e não ter tempo de reacção, para além de alguns problemas óbvios com a questão do centro de gravidade). Mas, hoje, o seu pé esquerdo esteve connosco. Continuo a dizer que sabe jogar à bola, e que, portanto, tem de fazer disto mais vezes.

Silas (5) Tem classe e isso é inequívoco. Devemos-lhe muitos pontos e precisamos imenso dele para dar qualidade ao nosso ataque.

Meyong (4) Voltou aos golos e está em franca recuperação após a asneira que foi aquela coisa do Lokomotiv, por cujo processo, afinal, fomos nós que pagámos (em pontos).

Dju (4) Quatro para um suplente não é muito se considerarmos que foi a sua crença e experiência que roubou a bola para o 2-0 e que nos estabilizou o jogo.

Gaspar (3) O que fez, fez muito bem.

Uma pequena referência para a arbitragem: A arbitragem nacional perdeu uma excelente oportunidade de não ter um árbitro como Olegário Benquerença.
Além disso, provou-se á exaustão que somos o clube o clube mais gamado do mundo, pois até quando dá jeito ao Benfica que seja ao contrário, os árbitros nos gamam, como fez hoje Olegário, que, de árbitro, tem pouco, muito pouco.

Voltando ao início, hoje viveu-se no Restelo um ambiente que habitualmente não existe.

Notei uma espécie de confiança e vontade de apoiar e de ganhar no ar. Notei isso mal entrei no estádio na forma como a equipa foi aplaudida na entrada. Há décadas que vou ao Restelo, mas ainda há fenómenos que me ultrapassam.

Por outro lado, atendendo ao concreto contexto desta época, e friso bem que isto tem que ser percebido por referência a este contexto, que é muito mau e em que batemos records negativos de assistência, pode-se dizer, face à gente que esteve no estádio (estimo em 10.000) que grande parte do Belenenses se mobilizou. O que não é fácil nos tempos que correm.

Há duas ilusões que não tenho. A primeira, o facto de lá ter estado muita gente que não é Belém. A segunda, a noção de que muita gente do Belém ainda ficou em casa.
Há, ainda, uma terceira: a de que isto não é uma coisa de fundo, mais apenas pontual.

Mas, reconheço, com viva satisfação, que grande parte da massa presente foi o Belém (em parte) mobilizado. E isso é bom.
Sou um crítico das (não) medidas tomadas para estancar a rarefacção da massa adepta. Continuo a dizer e a frisar que não acredito nestes modelos das borlas/convites e que o problema só se resolve na fonte – mobilização de base que não seja só para jogos de desespero.
Além disso, nada disto faz parar a sangria da massa associativa propriamente dita.

Mas, no contexto em que vivemos, reconheço que a mobilização possível foi conseguida e nesse particular, tendo em conta que o nosso momento é de fazer tudo o que estiver ao alcance, não posso deixar de dar os parabéns a quem, em primerio lugar o merece – o Povo Belenenses, ou seja, nós, anónimos adeptos daquela bancada - mas também à direcção pela forma como decidiu e levou a cabo esta mobilização.

Como se sabe, sou profundamente contra esta direcção. Para mim, é um dos males do clube.

Além disso, repito: isto não exclui a necessidade de se perceber que o clube precisa de uma mudança radical, a começar pelos seus próprios dirigentes. Aliás, o ambiente que se passou hoje deveria levar a perceber profundamente onde se tem falhado.

Mas, quanto à questão concreta da iniciativa, há que dar o seu a seu dono e, portanto, parabenizar quem a decidiu e levou a cabo.

E aproveito o ensejo para PROPOR QUE NOS MOBILIZEMOS O MAIS POSSÍVEL PARA A IDA AO BESSA ONDE, SEM NADA A PERDER, IREMOS, SEM DÚVIDA, COM O MESMO ESPÍRITO DE ENTREGA E DE SACRIFÍCIO, SACAR OS 3 PONTOS.

Há uma última coisa, que tem a ver com a minha antevisão. Jogámos com Homens. A derrota de há 2 anos foi limpa (tanto quanto uma coisa dessas se pode limpar).

Dessa vez, perdemos adeptos. Hoje, somos capazes de ter ganho alguns.

É para isto que os clubes existem.

VIVA O BELÉM!!!!!