quinta-feira, 3 de novembro de 2005

De estado de graça em estado de graça, até à desgraça final...

Temos um novo treinador. Esta notícia não é novidade para ninguém e mesmo a escolha do nome do actual responsável técnico pelos destinos da nossa equipa de futebol não terá também constituído grande surpresa, pelo menos para alguns adeptos mais atentos àquilo que a casa "gasta".

Vivemos pois um novo estado de graça. É normal. Na actividade desportiva, como em qualquer outra, a começar pela política, a fase inicial de funcionamento de uma nova gestão beneficia sempre de um período de observação, de expectativa, de aceitação tácita de decisões, que normalmente cabe na designação elástica e algo complacente de "estado de graça". Viveu-se, recentemente, uma situação dessas no nosso Clube, após as últimas eleições para os Corpos Sociais. Entrou-se assim inevitavelmente num novo estado de graça, que já devia ter expirado há muito, embora, desgraçadamente, para alguns ainda se mantenha em vigor. Aliás, um dos mais graves problemas do Belenenses é viver num estado de graça permanente que se arrasta desde há longos anos, mas isso será assunto a tratar em outra ocasião.

O futebol não foge à regra. E isto não tem nada a ver com o nome do novo treinador. Um estado de graça é sempre um pagamento antecipado, uma espécie de subsídio de instalação que, espera-se, será amortizado a médio ou longo prazo. E é precisamente o prazo de amortização que determina a extensão do estado de graça, que não poderá compadecer-se de factores que lhe são extrínsecos, sob pena de por eles ser ferido de morte. No caso do novo treinador da equipa de futebol do CFB, o facto de alguns o considerarem afecto ao Clube, razão que terá provavelmente influenciado a opção que foi tomada, não deve de modo algum ser factor que afecte o estado de graça a que José Couceiro tem legitimamente direito. Não ponho em causa o seu belenensismo, nem me preocupo sequer em saber se é autêntico. Não é isso que interessa num profissional. Também não ponho em causa o meu belenensismo (e estou certo da sua autenticidade), e isso não me habilita a que alguma vez passe pela minha cabeça, ou por qualquer outra com um número mínimo aceitável de neurónios funcionais, vir a ser treinador do Belenenses. São portanto outros os argumentos de Couceiro. E é com base neles que esperamos e exigimos um bom trabalho. Oxalá o consiga!

Num evento precário como um campenato de futebol, que tem um curto período de gestação de nove meses até ao nascimento de um novo campeão e à condenação dos despromovidos, os estados de graça não se compadecem com uma elasticidade infinita, sob pena de rebentarem muito antes do que se espera. É claro que ninguém vai exigir que Couceiro faça em dois dias o que outro não fez em quase dois anos. Mas o campeonato tem trinta e quatro jornadas e quase um terço já lá vai. Os pontos perdidos não voltam a estar em jogo. É perigosa a ilusão de pensar que no jogo seguinte se podem recuperar alguns dos pontos que se perderam nos anteriores. Nada mais falso: em cada jogo só estão em disputa os três pontos a que dá acesso. Mais nada! É aí, e só aí, que se ganha ou perde o que está em jogo.

Os estados de graça, num campeonato de futebol, são um "pau de dois bicos". Se, por um lado, poderá haver um efeito positivo da chamada "chicotada psicológica", em que cada vez menos gente acredita, por outro, há riscos que podem ser irremediáveis. É que durante a vigência de um estado de graça também há pontos em causa. Não podemos esquecer ou monosprezar esta realidade. Passado o actual estado de graça, entrar-se-á numa fase de "produção" finda a qual, se a equipa não produzir os resultados que todos esperamos e desejamos, virá possivelmente um novo ciclo com os respectivos estado de graça, fase de produção e por aí adiante... Entretanto, o campeonato estará perto do fim. Não podemos correr o risco de caminhar de estado de graça em estado de graça... até à desgraça final.

Saudações azuis.