segunda-feira, 20 de março de 2006

O Reverso da Medalha

Quando perdemos, a culpa é nossa, dos “piores adeptos do mundo”. Quando ganhamos, o mérito é “deles”, dos grandes dirigentes que temos.

É uma característica da mente humana experimentar uma sensação de alívio, um “autoapaziguamento”, aquando da ocorrência de um evento agradável, positivo, após um longo e sofrido período de provação. Os belenenses, como seres humanos, também não escapam a essa regra.

É pois natural que estejamos aliviados, felizes com a última vitória do nosso Clube. Creio que nunhum adepto de outro clube estará hoje tão feliz como nós. Contudo, uma outra característica da mente humana é ser capaz de não extrapolar exagerada e perigosamente um sucesso, tal como ser capaz de reagir a um fracasso. É pois também natural que não nos deixemos perturbar com fogos de palha.

Vitórias como as recentemente alcançadas sobre o Braga no Restelo e o boavista no Porto aquecem-nos a alma, alimentam-nos a esperança, dão-nos coragem para trabalhar. Mas não nos fazem esquecer as dificuldades por que temos passado, por que passamos, por que (quase) certamente continuaremos a passar.

Não nos fazem esquecer as derrotas humilhantes deste ano zero que vivemos, e de todos os anos zero que o antecederam. Não nos fazem esquecer a vergonha da mão estendida, da vassalagem mal disfarçada. Não nos fazem esquecer a dor de ver o nosso emblema coberto de lama, o nosso azul desmaiado, o nosso estádio vazio. Não nos fazem esquecer a falta de ambição de quem nos governa, a incompetência, o conformismo com a mediocridade. Não nos fazem esquecer que o Belenenses não é campeão há 60 anos! Que não é isto que nós queremos.

Queremos um Belenenses campeão. Queremos que o Belenenses seja o maior do mundo! Quem o tem dirigido não o conseguiu. Quem o for dirigir com a mesma filosofia, que impera há várias décadas, não o conseguirá.

Quem estiver a ler estas linhas poderá pensar que são injustas. Não são! Não são injustas para ninguém, nem têm qualquer intenção de o ser. É preciso saber enquadrar os acontecimentos pontuais no contexto geral em que, icontornavelmente, se inserem. As últimas vitórias do Belenenses são importantíssimas, sem dúvida, para não descermos de divisão. Importantes em primeiríssimo lugar para o próprio Clube, que está acima de qualquer de nós, de qualquer tendência, de qualquer projecto de liderança. Importantes para quem quer um Belenenses diferente, que poderá trabalhar num Clube que (já) é da primeira divisão. Importantes até para quem se satizfaz com “este” Belenenses, que assim pode, mais uma vez, sacudir a água do capote.

As recentes vitórias do Belenenses e as próximas, que todos esperamos e desejamos venham a acontecer, enchem-nos de alegria, que deveremos saborear na justa medida. Mas contêm em si efeitos perversos.

O primeiro efeito perverso é o de fazerem esquecer, nas mentes mais imediatistas, o fracasso que foi a presente época. Não podemos ignorar que os objectivos traçados à partida eram a Taça de Portugal e uma classificação nos cinco primeiros lugares do campeonato. A Taça, foi-se logo na primeira eliminatória, perante um adversário do escalão secundário. Na primeira liga, um lugar “confortável” no meio da tabela será o máximo a que podemos aspirar, mesmo que ganhemos todos os jogos até ao fim do campeonato, sem esquecer que boiar na linha de água foi a nossa actividade maior durante o mesmo.

O segundo efeito perverso é o do aparente êxito das "mudanças" estratégicas. Por mera coincidência, a mudança (???) ocorrida na SAD marca o início daquilo que, todos esperamos, será o período de recuperação. Não faltarão certamente candidatos, devidamente acompanhados pelos seus fiéis acólitos, a apropriarem-se desses louros. Não vejo é como conseguirão demonstrar que os merecem. Não venham dizer que tudo isto estava criteriosamente programado a longo prazo ou foi milagre desencadeado por um simples estalar de dedos.

Salvé Belenenses, no lugar que é teu, entre os maiores! Parabéns a todos aqueles que continuam a lutar por ti. Mas que ninguém pretenda assinar o seu nome num “diploma de salvação”. Que ninguém se dê ao trabalho de, no final da época, vir passar um chapéu diante de nós.

Para esse peditório não contribuimos. Nem contribuiremos nunca!

Saudações azuis.