quinta-feira, 27 de abril de 2006

Até sempre, Mariana

A minha crónica desta semana é curta, triste e, aparentemente, não tem a ver com o Belenenses. Peço desculpa.

As razões são duas e são simples: a primeira, é que as paixões, embora não ocupem lugar, lutam implacavelmente pelo tempo umas das outras; a segunda, é que a minha capacidade não é infinita, como era a ternura da Mariana.

Muitos dos meus amigos, entre os quais se incluem editores deste blogue e, eventualmente, alguns dos seus leitores, que conheceram a Mariana, já sabem o que se passou. Há muito que compreendiam o que a Mariana significava para mim e não me regatearam o seu apoio e solidadriedade. Já lhes agradeci pessoalmente, mas quero voltar a fazê-lo, agora por este meio.

A Mariana decidiu ir ter com a nossa Rosa Maria...

Na semana da Páscoa, no Alentejo, a Mariana adoeceu. No Domingo de Páscoa vim com ela para Lisboa e, nessa mesma noite, ficou internada num hospital veterinário. Apesar de todos os esforços que foram feitos, a Mariana morreu quatro dias depois.

Até sempre, Mariana!

No dia seguinte, de manhã, fui, com a minha mãe e um amigo da família, buscar o corpo da Mariana ao hospital e tratar de marcar a sua cremação. Depois, vivemos as primeiras horas de saudade da Mariana na nossa terra, em Belém. A seguir ao almoço, numa Belém (quase) irreconhecível, a fervilhar de espanhóis, alemães, franceses e japoneses (mesmo num dia de semana), casas de hamburgers, pizzas e souvenirs de coisa nenhuma, resolvemos ir à procura do nosso bairro, aquele que deu o nome ao nosso Clube.

Já existe muito pouco, mas a nossa procura não foi em vão. Na Rua de Belém encontrámos duas casas, que se mantêm tal qual como eram nos dias de juventude da minha mãe e da minha primeira infância. Entrámos, agora com o coração apertado por duas emoções.

Uma delas é a casa de móveis Cordeiro, quase ao lado dos Pastéis. O filho do antigo dono ainda se lembrava da minha mãe, falaram dos “seus tempos”, dos móveis antigos para restaurar que ainda por lá aparecem, das pessoas que já desaparecerem. Todos belenenses!

A outra é a sapataria Barroso, que ostenta ainda uma placa a dizer “Só se aceitam encomendas com signal” e se dedica a fazer (ainda à mão) botas para competições equestres, mas que outrora funcionou também como alfaiataria, onde trabalhou um (na época) conhecido alfaiate belenense, o Sr. Silva, pai da não menos conhecida e célebre actriz Ivone Silva, infelizmente também já desaparecida. Na conversa entre a minha mãe e a nora do antigo proprietário abordaram-se os incontornáveis temas relacionados com as gentes que passaram pela casa, tendo-se falado ainda nos “Ecos de Belém”, o jornal mais importante do nosso bairro, que também deixou de ser publicado há muito tempo...

À saída, a minha mãe não resistiu à tentação de preguntar à senhora, Maria de Lurdes, de sua graça:
- Ainda é do Belenenses?
- Claro que sou do Belenenses! Sou, sempre fui e continuarei a ser. Eu até fui campeã de basquetebol pelo Belenenses em 1947!

Na altura em que esta crónica for editada, a Mariana estará a ser cremada. Não posso voltar a pôr-lhe ao pescoço o cachecol da Cruz de Cristo, como sempre fazia ao chegar a casa após uma vitória do Belenenses. Mas continuarei a erguê-lo com orgulho, também em memória dela. Ela ficava tão linda com o cachecol do Belenenses ao pescoço...

Saudações azuis.