quinta-feira, 20 de abril de 2006

Jornaleiros Desportivos – Guardiões do Sistema

Não sei se já repararam mas o jornal “Record” tem movido uma perseguição implacável ao Nacional. Ainda a semana passada, lá vinha um tal Joaquim Semeano (que já teve oportunidade de mostrar a sua ignorância sobre o Belenenses) dar mais uma tacada. Até à data, para nós infeliz, da vitória do Nacional sobre o Belenenses, todas as semanas, na última página, lá vinha a piada: “nos últimos 8 jogos, o Nacional só fez 4 pontos”; “nos “últimos 6 jogos, não ganhou nenhum”.

E tudo isto porquê? Apenas e só porque Rui Alves, presidente daquele clube, afirmou que o Nacional era do mesmo campeonato do Sporting! Imediatamente os guardiões do sistema descarregaram a sua ira sobre tal afirmação, que fulminaram como criminosa e obscena, invocando (conforme a preferência) sobre o dito presidente e a agremiação madeirense, aos raios de Júpiter, a condenação (eterna) aos infernos, ou as maiores punições kármicas. Expressa ou implicitamente – às vezes de forma bem clara – chegam ao cúmulo de atribuir os desaires nacionalistas à ousadia, ao desplante, ao atentado ao pudor e bons costumes que, no seu entender, constitui tal afirmação.

E, no entanto, Rui Alves ofendeu alguém? Querer competir de igual para igual com o Sporting é algum crime ou imoralidade? Decerto que não. Mas para um dos supremos defensores do sistema – a generalidade da classe jornalística desportiva – as coisas não são assim. Consideram que tal pretensão deve merecer o mais vivo repúdio.

Este episódio mostra à saciedade o que se levanta, de vários ângulos, contra quem ouse discutir a vigente oligarquia tricolor.

Ora, de todos os clubes portugueses, o Belenenses foi o que mais consistentemente fez frente a essa oligarquia – a tal ponto que, durante 60 anos, não houve remédio se não falar em “quatro grandes”. Mas, por isso mesmo, e salvas as honrosas excepções, a comunicação social, infestada de benfiquistas (e, a seguir, de adeptos dos outros dois que são o reverso do nacional-benfiquismo), sempre nos detestou. Foi assim desde o nosso nascimento – nos primeiros anos, fomos acusados de tudo -, passando pelas décadas em que tiveram que engolir os nossos êxitos, até aos dias actuais em que, rapazinhos imberbes despejam a sua brutal ignorância sobre o Belenenses (e sobre tudo o que não seja a “santíssima (?) trindade”).

Por isso, não é de estranhar que num dos livros de Acácio Rosa (dedicado ao período 1919-1960), encontremos reproduzido um texto, datado de 1953, do jornalista Artur Inês, do “Norte Desportivo”, de rara honestidade e invulgar desassombro. Ei-lo aqui:


“Não é necessário enunciar todas as causas dos males que afligem o futebol nacional. Basta apenas enumerar as que aí ficam, com a afirmação que é preciso fazer, sem medo, de que algumas pessoas que escrevem em jornais desportivos, ainda que não elementos preponderantes da Imprensa, mas por estes consentidos, não estão à altura das circunstâncias, porque especulam frequentemente com as baixas tendências do vulgo clubista em vez de se dedicar a uma obra digamos didáctica de crítica séria e objectiva que construa e não derrube.

Tenho notado – digo-o com certa tristeza – que nem todos os clubes portugueses são tratados no mesmo e decente pé de igualdade em que o deveriam ser. Parece que para certos rapazinhos que rabiscam coisas de futebol nos jornais e que – lindo futuro, este! – serão um dia, possivelmente , os seus mentores, uns são filhos e outros enteados...

Por mim digo que sou sócio de um clube desportivo e desse não falo para não me acusarem de pecado de parcialidade, o qual nunca me roçou a epiderme, mas posso falar de outros, como por acaso o Clube de Futebol «Os Belenenses», cujo esforço para prestigiar a modalidade tem sido enorme e respeitável através dos seus quase trinta e cinco anos de existência e em cujos quadros dirigentes figuram homens com o prestígio moral e desportivo do ilustre oficial da Marinha que é o comandante Francisco Reis Gonçalves, um nome que os verdadeiros desportistas de amanhã terão de venerar, seguindo-lhe o exemplo digno, se quiserem fazer obra séria.

Este grande clube, «Os Belenenses», pode ser que eu esteja enganado, mas parece-me que raras vezes goza das graças daqueles que, nos jornais, mais podiam fazer por ele – pondo-o simplesmente a par das outras grandes colectividades desportivas portuguesas. Porque «Os Belenenses» ainda que nem sempre sejam assoprados e gritados nas tubas canoras da fama, constituem, quer queiram quer não os detentores das verdades oficiais do desporto, um grande, notável e poderoso agregado desportivo que merece o meu maior respeito e entusiástica admiração.

E creio, digo-o com aquela rude sinceridade que uso em todos os actos da minha vida, que a forma como foi tratada aquela colectividade quando há poucos dias perdeu o seu jogo do Campeonato na Covilhã mereceria um pouco mais de amparo, um pouco mais de carinho – vamos um pouco mais de simpatia.

É um clube com quase trinta e cinco anos de existência por onde passaram autênticas glórias do futebol nacional, é um clube com uma massa associativa considerável e é sem favor nenhum, no momento em que traço estas regras, o «leader» do Campeonato Nacional.

Será pedir muito que respeitem, já que o não admiram?”

Já então era assim. Hoje, é muito mais grave, porque o despudor aumentou; e quem devia cuidar da imagem do nosso Belenenses, faz o quê?
Post-Scriptum – Estamos a fazer um dos 5 piores campeonatos de toda a nossa história – com agravante de que 2 dos restantes se deram em ocasiões em que pura e simplesmente não tínhamos dinheiro. Mas ao menos que se acabe com dignidade e evitando um mal maior e ainda mais vergonhoso. Vamos ser claros: com 46 pontos, ou seja, ganhando os três jogos que faltam, não descemos de certeza. Do mal, o menos. Acabem com este sofrimento, senhores jogadores e treinadores. E não façam contas por baixo, que vai haver muitos fenómenos do Entroncamento. Vai uma aposta que, se vencer o Boavista, o Guimarães não perde na festa de um F.C.Porto já a borrifar-se para os pontos?

Uma coisa é certa: 46 chegam. Metam isso na cabeça!