Não!
Há uns dias atrás, muito antes do fatídico primeiro domingo de Maio, tinha pensado em escrever uma crónica com este título e (quase) o mesmo conteúdo. Venho cumprir esse auto-compromisso. Serei breve.
Até ao final da tarde desse domingo acreditei que o Belenenses não desceria de divisão. Sem mérito, é certo, por obra de milagre alheio, que lhe evitaria o prejuízo, mas não a vergonha. Tinha por isso decidido que o final formal da época seria a altura correcta para “pedir a cabeça” de quem levou o Clube à situação em que se encontra. Não haveria nada a festejar, apesar da “manutenção”, disse-o e escrevi-o também. Ter-se-ia fechado mais um ciclo que não poderia voltar a repetir-se. Tinha chegado a hora da mudança, da tão falada ruptura, que começaria pela demissão de todas as estruturas dirigentes do Clube.
Sei que muitos dos meus consócios e companheiros de sofrimento continuam a pensar que essa será a medida certa. Respeito a sua opinião e compreendo a razão que têm. Mas é a este respeito que me concedo o direito de fazer uma pequena alteração àquilo que eu próprio pensava há uns dias atrás. Quem conduziu o nosso Belenenses à vala comum onde agora jaz que o tire de lá. Este não é o nosso Belenenses, este é o Belenenses deles, que eles, conscientemente ou não, fizeram. Eu quero que nos restituam o nosso Belenenses e então, aí sim, vão-se embora que nós tomamos conta dele.
Há duas ou três décadas que o Belenenses vem definhando e esta última queda não resultou de um tropeção acidental. Há muito que o Clube não ganha nada, que não dá alegrias aos seus adeptos que, também por isso, o foram abandonando. Há muito que se foram os anéis de um rico e glorioso património moral, de que hoje só restam dívidas materiais que não podemos pagar e recordações para contar àqueles que, por não terem nascido “a tempo”, não puderam sentir na pele e na alma a grandeza que este Clube já teve. Quer isto dizer que o Belenenses hoje em dia, desportivamente vale zero; há muito que os anéis se foram…
E os dedos, ficaram? Infelizmente, também não! Quer isto dizer que o Belenenses, socialmente, também vale zero.
Durante o longo período de má gestão de recursos financeiros, materiais e humanos, de indefinição de objectivos e de ausência de projectos, que levou o Clube à anulação desportiva, os responsáveis pela “façanha” trataram também de apagar a sua imagem. E conseguiram-no de forma eficaz, com a sua política de compadrios duvidosos, de humilhações às sobras dos nossos adversários, de vassalagens a emblemas inimigos. Se é verdade que a palavra “Belenenses” há muito tinha perdido o seu peso desportivo, socialmente, ainda há bem pouco tempo, conservava algum peso e significado na sociedade portuguesa. A política do “cinzentismo”, tão bem ilustrada pela “fase da asneira” que se veio a perpetuar, anulou o valor social da palavra “Belenenses”.
Um sinal concreto dessa anulação social aconteceu ainda há bem pouco tempo, a propósito de um nosso “colega de infortúnio”, o Vitória de Guimarães, quando a Comunicação Social e outros alfobres do pensamento lusitano transformaram a possibilidade de queda desse clube numa verdadeira catástrofe nacional. Com a queda do Belenenses alguém se preocupou? Pois é, o Belenenses já não tem qualquer “peso” na sociedade portuguesa.
Com este apagamento da imagem do Clube coincidiu o desaparecimento da sua Alma e do seu Corpo. Os anéis já se tinham ido, agora, com o corpo, foram-se os dedos…
Escrevi acima: “eu quero que nos restituam o nosso Belenenses e então, aí sim, vão-se embora que nós tomamos conta dele”. É um direito que nos assiste, sem dúvida. O problema, é que nenhum de nós acredita que quem enterrou o Clube, tenha capacidade para restituir o seu corpo a quem quer que seja. Não foram capazes de o manter vivo, não vão ser capazes de o ressuscitar!
Alguém terá que o fazer. Compete a cada um de nós e a todos, belenenses, essa tarefa. A começar pelos dedos. Até porque, sem eles, não vale a pena procurar anéis…
Saudações azuis.